Aos ativistas LGBT’s e de todos os movimentos
sociais,
Vivemos em uma sociedade capitalista que
promove cruelmente diversas opressões, infelizmente fui dar conta disso muito
tarde, somente depois de sentir na pele o seu poder de destruição. Escrevo essa carta a todos os militantes que
conviveram comigo, que conhecem minha trajetória, que atuam ou tem interesse no
sucesso do movimento LGBT. Escrevo para explicar aos companheiros e
companheiras minha última decisão: por que entrei no PSTU.
Comecei a me organizar politicamente muito nova,
primeiro com o grupo de Jovens da Comunidade Católica do meu bairro por
influencia da minha família, tradicional, conservadora e católica, em seguida
com o Movimento Estudantil nas escolas, mesma época que me filiei no Partido dos Trabalhadores onde fiquei
por 9 anos.
Em 2005 iniciei minha militância no movimento
LGBT em Contagem, desde então vivenciei muitas histórias de luta e decepção, somente
hoje, depois de ter experimentado essas sensações que posso compreender,
avaliar e decidir com consciência o melhor caminho para combater o capitalismo
e suas opressões. Vi nascer e crescer um grande movimento. Aliás, o maior que
já vi em Contagem. Nada, nem ninguém, levou mais pessoas para as ruas da cidade
nos últimos anos que o Movimento LGBT. A cada ano percebia o nosso crescimento enquanto
movimento social, seu amadurecimento político e suas intervenções na cidade.
Recebi a difícil missão de liderar este
movimento na cidade, onde passei por várias situações que hoje posso entender
que nada mais são que as pressões da sociedade capitalista sobre nosso
movimento. Uma das que me senti mais incomodada foi quando um ex-secretário da
prefeitura me pediu para reconsiderar o local de concentração da Parada do
Orgulho LGBT de Contagem, visto que existia um pedido da CDL, do Big Shopping e
da CONPAQ (Conselhos de Pastores de Contagem) à Prefeitura de Contagem para a retirada
da parada daquele local. A CDL e o Big Shopping reclamavam que a Parada
atrapalhava as vendas do Dia dos Pais e a CONPAQ que a concentração era em
frente à Igreja e atrapalhava o Culto da mesma. O que foi triste não foi a
manifestação deste setores, que já era esperada e rotineira, mas sim o fato do
PT, que governava a prefeitura, fazer coro com estes setores reacionários. Foi
quando me dei conta que o PT já não era mais o partido para chamar de “meu”, pois
ele já não mais defendia às nossas lutas, mas os interesses de uma classe
dominante atrasada e mesquinha. Resisti, junto com outros companheiros e
companheiras, à mudança de local, por que julgávamos que os LGBT´s tinham
direito a fazer sua parada no local de maior visibilidade da cidade.
Infelizmente, no ano passado, o PT conseguiu o que queria e a parada mudou de
lugar.
Esses desgastes que aconteceram tanto na
minha relação partidária, quanto no grupo que participava que no meu entender
atuava de maneira governista, prejudicando os avanços das políticas publicas
LGBT na cidade, esta percepção acabou culminando na minha desfiliação do PT e
em uma dissidência no movimento, onde eu e mais alguns companheiro com o mesmo
entendimento, fundamos o Movimento Organizado de Combate á Homofobia (MOOCAH)
que nasce em outubro de 2010 com uma ideia de movimento independente pautado
pela luta incansável contra o racismo, machismo e homofobia.
Essa dissidência não foi fácil, onde no
primeiro ano com dois movimentos na cidade passaram mais tempo se desgastando
como pares do que enfrentando o real e poderoso inimigo, o capitalismo que
impera sustentando a homofobia cada vez mais visível em Contagem. Um erro que
quase custou caro e que só favoreceu nossos inimigos, os homofóbicos. Erro que
assumo minha parcela de culpa, talvez por falta de amadurecimento político,
talvez motivada pela inflamação dos ânimos no ápice das disputas entre os
movimentos.
O MOOCAH sofreu com uma onda de calunias,
principalmente no período da II Conferencia Estadual LGBT, onde foi acusado de
defender o Governo do Estado, sem sequer ser consultado por aquele que os acusaram,
de forma até descuidada, que nem perceberam que o MOOCAH assinou e ficou do
lado de todas as moções de repudio contra o Governo Tucano. Acredito que talvez
tenha sido mais envolvimento das emoções do que “descuido”, uma entidade que
tirou na marra a I Conferencia Municipal LGBT de Contagem, onde teve audiência
com secretario de Governo, ofícios, campanha em rede social para tirar a
conferência do papel, ela aconteceu mesmo com alguns dias fora do prazo
estabelecido por decreto nacional. Após
estes dois atos, foi realizada uma campanha covarde na internet intitulada “De
Olho no Movimento” que conseguiu criar polemica e desavenças dentro dos grupos
LGBT das Região Metropolitana, atacando as companheiras da ALEM- Associação
Lésbicas de Minas, que foi grande parceira da nossa entidade no ano de fundação,
não assinava com o nome da nossa entidade, mas dava entender que era de nossa
autoria, atitude cruel e com característica de quem com certeza não queria a
continuidade de nossas ações dentro do Movimento LGBT.
Antes mesmo dessa onda de boatos na Internet,
o MOOCAH em reunião com o outro grupo LGBT da cidade, foi acusado de ser uma
entidade eleitoral, que foi fundada única e exclusivamente para me eleger
Vereadora e na qual a história se encarregaria de contar os fatos.
Com todas essas forças para enfraquecer o
MOOCAH, tivemos muitos momentos de crise internas e debates calorosos para
continuar resistindo a cooptação e manter a linha da independência financeira,
sem receber dinheiro público, de políticos ou entidades privadas com interesse
em tutelar nossa luta. O grupo se
desgastou, muitos militantes foram se afastando e nossa intervenção na cidade
caiu bastante.
Foi necessário um ano para reflexão de tudo
que aconteceu para entender que não só podemos como precisamos reerguer o
MOOCAH, até porque, nunca na história da cidade, houve um governo capaz de
avançar na defesa e promoção dos Direitos LGBT, nem o Governo Marília Campos,
que teve oportunidade de regulamentar a Lei 3.506 da Ex-Vereadora Letícia da
Penha, que pune a discriminação por orientação sexual na cidade, esta lei foi
aprovada em 2001, sancionada em 2002 pelo então Prefeito Ademir Lucas e não foi
regulamentada nos 8 anos de governo do PT em Contagem, e não foi por falta de
cobrança, o movimento sempre se posicionou, inclusive até participou do
Orçamento Participativo de 2009 onde lideramos a Obra da Construção do Centro
de Referencia em Direitos Humanos em Contagem para ser construído e entregue
até 2011 na região do Eldorado em Contagem, obra no valor de R$223.300,00 que
até hoje nem começou a ser construída.
Atualmente todos os casos de homofobia em
Contagem são encaminhados pelo Movimento Social para Belo Horizonte por falta
de estrutura pública, por mais que a Lei 3.506 no seu Art. 7º fala: ” - O Poder Executivo deverá manter setor
especializado para receber denúncias relacionadas às infrações a presente Lei.”
O Governo Marília campos, que praticamente não teve oposição em Contagem, teve
oportunidade de mudar esta história e não o fez.
Em 2012 tivemos a eleição do Prefeito Carlin
Moura (PCdoB), até então grande aliado do movimento, inclusive muito atuante na
Frente Parlamentar LGBT da ALMG enquanto Deputado. A eleição de Carlin Moura
teve apoio incondicional dos evangélicos, talvez por isso o então candidato
pela primeira vez não tenha comparecido a Parada do Orgulho LGBT da Cidade no
ano eleitoral. A população de Contagem, que pela primeira vez pode contar com
horário eleitoral na TV, se deparou com propostas como “Criação do Morro da
Oração e do Parque do Batismo”, um verdadeiro estupro do Estado Laico, infelizmente
sendo proposta de um ex-aliado e de um partido que se diz comunista. Pois bem,
Carlin foi eleito e uma de suas primeira ações de Governo foi nomear o Ex-Vereador
Pastor Silva (PRB) como Secretário de Direitos e Cidadania de Contagem, o mesmo
Vereador que pediu vistas do projeto 056 2011 e também um dos responsáveis por
mobilizar mais de 100 pastores contra o mesmo projeto, projeto este que não foi
aprovado, mas que também não atingiu a já sancionada Lei 3.506 onde ouvia-se
rumores que a real tentativa era de revogá-la.
Desconheço a história do Pastor Silva em beneficio dos Direitos Humanos
em Contagem, pelo contrário, neste momento que os movimentos estão na rua para
pressionar a queda de Marco Feliciano da Comissão de Direitos Humanos, Pastor
Silva representa o mesmo retrocesso, porém em âmbito municipal.
O MOOCAH iniciou debate com alguns movimentos
e militantes independentes da cidade para organização de uma Frente Popular em
Favor do Estado Laico na cidade, e em breve vai publicar um chamamento para
todas e todos aqueles que não se sentem representados por estes senhores, vir
conosco para rua, para pedir as suas respectivas saídas desses importantes
espaços de manutenção, defesa e avanço dos Direitos Humanos, direitos esses
seriamente em risco com a presença de figuras fundamentalistas como destes dois
senhores.
Depois deste período de reflexão e de recarga
de energias, mobilizei os fundadores do MOOCAH para sensibilizá-los da
necessidade de retorno da nossa atuação, de como a cidade precisa ainda mais da
nossa garra, luta e resistência. Até
porque há indícios que o discurso de governo plural do PCdoB seja mais cruel e retrógrado do que o negligente de Marília Campos.
Contagem precisa da nossa militância para fazer oposição ao capitalismo!
A minha volta ao movimento LGBT está
caminhando com outra importante decisão na minha vida, a de me filiar novamente
a um Partido Político, desta vez com amadurecimento, consciência e muita
cautela. Em 2011 conheci alguns militantes do PSTU e desde então fui só me
aproximando do partido, ficou mais forte ano passado quando apoiei a
candidatura do companheiro Gustavo Olimpio para Prefeito de Contagem. Comecei
este ano a frequentar as atividades no Diretório de Contagem, inclusive
participando de atividades de formação política. Esta experiência tem sido
muito interessante, porque pela primeira vez me sinto pertencente e segura da
pratica do discurso. Diferentemente de outros partidos que conheci, o PSTU tem
um debate alinhado com o combate às opressões, faz uma coluna classista, com
credibilidade intocável, não se furta em se posicionar contra a burguesia retrógrada da
cidade, e é nesse espírito revolucionário que eu me encaixo, é nesta vontade de
lutar fora dos gabinetes que me enquadro.
Por este motivo, decidi me filiar no Partido Socialista dos
Trabalhadores Unificado, por que sinto que esta luta me pertence e a recíproca
é verdadeira. Hoje entendo aquela frase que escutei de outro militante e citei
no inicio deste texto, entendo e concordo com ela “a história se encarregou de
contar os fatos”.
Ana Carolina Diniz Benzaquen
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